terça-feira, 2 de abril de 2013

MP apresenta primeiras denúncias do inquérito da Kiss nesta terça-feira



Felipe Truda Do G1 RS, em Santa Maria 

  Boate Kiss Santa Maria (Foto: Felipe Truda/G1)
 Mais de dois meses após tragédia, fachada da Kiss ainda recebe homenagens (Foto: Felipe Truda/G1)
 
No mesmo dia em que familiares fazem a primeira das 241 vigílias em memória das vítimas do incêndio na boate Kiss, o Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul deve apresentar nesta terça-feira (2), em Santa Maria, as primeiras denúncias contra os indiciados pela polícia. Às 13h30, os promotores responsáveis pelo caso concederão uma entrevista coletiva, no auditório da Promotoria, com transmissão ao vivo do G1.

A denúncia do MP será entregue ao juiz da 1ª Vara Criminal de Santa Maria, Ulysses Fonseca Louzada, após o encontro com a imprensa. Na coletiva, os promotores Joel Dutra, Maurício Trevisan e David Medina apresentarão as primeiras análises sobre os indícios de crimes cometidos pelas pessoas apontadas no inquérito de 13 mil páginas, entregue pela Polícia Civil no dia 22 de março, após 54 dias de investigação.

No total, 28 pessoas foram apontadas pelos delegados que investigaram o caso como responsáveis pela tragédia. São proprietários da boate, integrantes da banda Gurizada Fandangueira, bombeiros, fiscais da prefeitura responsáveis pelas vistorias na casa noturna e até o prefeito Cezar Schirmer. A expectativa, no entanto, é de que as primeiras denúncias se concentrem no grupo dos 16 indiciados criminalmente, que teriam responsabilidade direta sobre a tragédia.

As eventuais ações sobre improbidade administrativa vão ser apresentadas em um segundo momento, assim como as possíveis denúncias contra os militares. Com exceção dos dois bombeiros que podem ser denunciados por homicídio culposo. Quanto ao prefeito de Santa Maria, a decisão sobre a denúncia cabe ao Procurador-Geral de Justiça, em Porto Alegre.

Como há suspeitos presos preventivamente – os sócios da Kiss, Elissandro Spohr e Mauro Hoffman, além dos integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão – o prazo para o MP apresentar as denúncias se esgotava na segunda-feira (1º). Mas devido à complexidade do caso e ao volume de documentos, os promotores pediram a prorrogação.

Os promotores pode incluir novos nomes entre os indiciados pelos delegados ou até mesmo retirar pessoas da lista. Se julgarem necessário, eles também podem mudar o enquadramento dos crimes. Outras possibilidades são o pedido de novas investigações à Polícia Civil ou mesmo o arquivamento da investigação sobre alguns indiciados.

A denúncia do MP vai dar início ao processo criminal na Justiça. Ela traz  a descrição dos fatos e aponta os responsáveis, que se tornam acusados. Se o juiz acatar a denúncia contra todos ou parte dos acusados, eles viram réus. Depois disso, a Justiça estabelecerá o prazo de 10 dias para as defesas se manifestarem. A partir daí, começa a fase de instrução do processo, com audiências para o depoimento de testemunhas, réus, etc.

          
Familiares prometem realizar 241 vigílias em memória das vítimas
Antes do MP se manifestar, familiares vítimas do incêndio na Kiss  prometem dar início a uma manifestação que só terminará no dia 29 de novembro. Eles devem fazer na manhã desta terça-feira, na Praça Saldanha Marinho, no centro do município, a primeira de 241 vigílias – uma para cada vítima da Kiss. O objetivo é  relembrar os entes queridos e chamar a atenção da comunidade para os trâmites legais do caso.

 Adherbal Alves Ferreira familiares tragédia boate Kiss (Foto: Felipe Truda/G1)
Adherbal Ferreira exibe cartaz da AVTS que identificará familiares das vítimas da tragédia durante as 241 vigílias (Foto: Felipe Truda/G1)

Segundo o presidente da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), Adherbal Alves Ferreira, familiares se revezarão no local, um grupo por dia. Uma barraca, com faixas e cartazes, vai identificar o grupo. O empresário espera que o início do ato, realizado em um dia chave para os desdobramentos da tragédia, ajuda a manter a mobilização pela punição aos culpados, mas garante que não foi nada planejado.

“Tem acontecido uma série de coincidências desde que ocorreu o incêndio. Na verdade, queremos ficar ali para que não sejamos esquecidos, e que as pessoas percebam que nós queremos justiça, e que estaremos vigilantes”, explica ele.

Adherbal não espera grandes mudanças em relação à lista de indiciados e denunciados pelo MP. Ele elogia o trabalho realizado pela Polícia Civil, mas afirma que é inevitável que alguns nomes sejam incluídos e outros sejam retirados da lista. No entanto, o empresário não se arrisca a afirmar o que mudaria em relação ao relatório do inquérito.

“O inquérito foi muito bem direcionado e bem feito, mas como disse o próprio delegado, eles não são 100% perfeitos. Poderia haver acréscimos e decréscimos, e acredito que o Poder Público deve fazer isto também. É bem possível que entre mais pessoas, como algumas também podem sair ou diminuir as penas. Estamos preparados para que isto aconteça. Na verdade, o Ministério Público está fazendo uma filtragem do que o delegado fez”, avalia.

Apesar de ter contato direto com o promotor criminal de Santa Maria, Joel Dutra, Adherbal evitou tomar conhecimento do conteúdo da denúncia à Justiça, para não se “privilegiar” em relação aos outros familiares de vítimas. Apenas combinou que se encontrará com ele, a pedido do  próprio promotor, para ser informado dos pontos principais das denúncias que serão apresentadas ao juiz.

Idealizador da AVTSM junto com o vice-presidente Leo Becker, Adherbal diz estar desgastado. Desde a morte da filha Jennefer, de 22 anos, ele deixou o comando da loja de móveis da qual é proprietário sob a responsabilidade do filho para se dedicar exclusivamente à entidade. Nos últimos dias, o cansaço bateu forte, diz ele. Subitamente, ele garante ter ganhado ânimo neste início de semana tão decisivo.

Pouco antes de receber a reportagem do G1, Adherbal se mostrou empolgado quando, ao telefone, programava eventos para a cidade. Sonha em levar o recém-eleito Papa Francisco a Santa Maria, além de outras celebrações, sempre com o objetivo de manter em evidência a luta por justiça para os familiares das vítimas. Homem de fé, ele acredita que a própria Jennefer está lhe dando forças.

"Até hoje (segunda-feira) de manhã eu estava muito cansado. Mas me concentrei, pedi forças a Deus, e, inclusive, pedi para minha filha me apoiar. E por incrível que pareça, ganhei um novo 'gás'. Me sinto renovado hoje, e olha que nem descansei no final de semana", conta Adherbal, com olhos marejados como raramente se vê em suas aparições públicas. "Não sei como explicar esta força", acrescenta.

Mesmo dentro da própria loja, encerrando os trabalhos no final de tarde, o empresário ostentava a foto da filha no peito, presa à camisa por um alfinete, como sempre fez desde os dias seguintes ao incêndio. O ato se repete todos os dias, não apenas quando há encontros da AVTSM, e ele garante que será assim pelo resto de sua vida. A justificativa é a afinidade que tinha com a jovem que cursava psicologia no Centro Universitário Franciscano (Unifra).

“Ele dizia que era o pai de saia. E eu digo hoje: eu sou a minha filha de calças. Éramos uma mistura muito homogênea, então é uma coisa só. Tenho ela no meu coração, comigo, e acho que vou ser assim por toda a vida. Esta causa toda é por amor”, afirma Adherbal.


Entenda
O incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, região central do Rio Grande do Sul, na madrugada de domingo, dia 27 de janeiro, resultou em 241 mortes. O fogo teve início durante a apresentação da banda Gurizada Fandangueira, que fez uso de artefatos pirotécnicos no palco. O inquérito policial, que indiciou 16 pessoas criminalmente e responsabilizou outras 12, conclui que:

- O vocalista segurou um artefato pirotécnico aceso no palco
- As faíscas atingiram a espuma do teto e deram início ao fogo
- O extintor de incêndio do lado do palco não funcionou
- A Kiss apresentava uma série das irregularidades quanto aos alvarás
- Havia superlotação no dia da tragédia, com no mínimo 864 pessoas
- A espuma utilizada para isolamento acústico era inadequada e irregular
- As grades de contenção (guarda-corpos) obstruíram a saída de vítimas
- A casa noturna tinha apenas uma porta de entrada e saída
- Não havia rotas adequadas e sinalizadas de saída em casos de emergência
- As portas tinham menos unidades de passagem do que o necessário
- Não havia exaustão de ar adequada, pois as janelas estavam obstruídas



FONTE: G1 – O PORTAL DE NOTÍCIAS DA GLOBO

  














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