Já são nove as empresas investigadas pelos Ministérios Públicos do país
por suspeita de formação de pirâmide financeira, segundo levantamento
da Associação Nacional do Ministério Público do Consumidor (MPCON).
Embora o caso mais conhecido seja o da Telexfree, cujas atividades
foram suspensas pela Justiça do Acre, o país tem registrado nos últimos
meses um "boom" de empresas que têm entrado no mercado se valendo de
estruturas com "fortes indícios" de pirâmide e "golpe", afirma o
promotor de Goiás Murilo de Moraes e Miranda, presidente da MPCON.
"Até quinta-feira eram oito as empresas investigadas. Agora já são nove", diz Miranda, em entrevista ao
G1.
Segundo ele, os inquéritos e procedimentos administrativos começaram a
ser abertos há cerca de quatro meses. O promotor não quer adiantar,
entretanto, os nomes das empresas investigadas.
"O esquema de pirâmide existe há mais de 60 anos. A diferença agora
está na velocidade que estas redes aparecem e se expandem entre cidades e
estados. Com a internet e a publicidade virtual, atingiu parâmetros que
não passavam nem próximo do que estamos vendo", explica.
MP estuda novos pedidos de suspensão
Por enquanto, a única ação judicial julgada foi a apresentada pela MP
do Acre contra a Telexfree, com abrangência nacional. O presidente da
MPCON afirma, entretanto, que outras empresas devem ser alvo de denúncia
à Justiça.
"Para os casos que a aparência de pirâmide se constatar, as medidas
deverão ser as mesmas pedidas no Acre: suspensão das atividades e
bloqueio de bens para tentar e ressarcir os consumidores", diz Miranda.
"Os Ministérios Públicos estão preparados caso houver alguma reversão da
decisão do Acre para ingressarem em seus estados com o mesmo pedido
contra a Telexfree", acrescenta.
Entenda a suposta fraude da Telexfree
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O que é a Telexfree?
A empresa Ympactus Comercial Ltda. ME, conhecida pelo nome
fantasia Telexfree, com sede no Brasil no Espírito Santo, diz atuar com
prestação de serviços de telefonia VoIP (por meio da internet)
Divulgação do produto
Para tornar o serviço conhecido, a empresa vende pacotes a
"divulgadores", que compram e revendem contas e "recrutam" novos
revendedores. A divulgação é feita principalmente pela internet.
Compra de direito
Para tornar-se um divulgador, o interessado precisa pagar uma taxa
de adesão e comprar os pacotes de contas, que custam a partir de US$
289. Ele convence outras pessoas a participarem, que também investem
dinheiro, e proporcionam comissão a quem convidou
'Pirâmide Financeira'
Avaliações do MPF e do Ministério da fazenda apontam que a
atividade comercial da empresa não é sustentável no longo prazo e
evidencia prática conhecida como "pirâmide financeira", o que é
considerado crime contra a economia popular
Investigações
O caso é investigado pelos MPs de ao menos 7 estados (Acre, Bahia,
Espírito Santo, Mato Grosso, Minas Gerais, Pernambuco e Santa Catarina)
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Crime contra a economia popular
O promotor lembra que, pela legislação brasileira, a prática de
pirâmide financeira se configura crime contra a economia popular. A lei
n° 1.521, de 26 de dezembro de 1951, estabelece pena de 6 meses a 2 anos
de prisão, além de multa, para o crime de "obter ou tentar obter ganhos
ilícitos em detrimento do povo ou de número indeterminado de pessoas
mediante especulações ou processos fraudulentos ("bola de neve",
"cadeias", "pichardismo" e quaisquer outros equivalentes)".
"Num esquema piramidal, a base sustenta quem está no topo. Ou seja,
quanto mais a rede cresce, mais gente vai perder dinheiro a custa de um
golpe de captação da poupança popular, com a venda de algo que, na
prática, não existe", explica o presidente da associação de promotores.
As empresas sob alvo do MP também são investigadas por suspeita de
outros crimes relacionados como lavagem de dinheiro e remessa para o
exterior.
O MPCON está elaborando uma minuta de projeto de lei para transformar a
pirâmide financeira em crime contra a ordem econômica e aumentar a pena
para até 5 anos de reclusão, com a possibilidade ainda de agravante de
mais um terço em caso de utilização de publicidade na internet.
Empresas negam pirâmide e pedem regulamentação
A Telexfree nega a prática de pirâmide financeira ou de qualquer
ilegalidade. A empresa afirma praticar o chamado marketing multinível ou
de rede. "Já faz um ano que a empresa está sendo investigada, mas a
questão é que não há no país uma legislação que trate de marketing de
rede. Por isso, exortamos que o Congresso legisle sobre esta matéria",
afirma ao
G1 o advogado da empresa, Horst Fuchs.
Segundo ele, "a venda de pacotes de telefonia VoIP conta com a
indicação de consumidores que são remunerados à exata medida de novos
consumidores" e que "a recompensa é resultado da indicação e não da
adesão". "O marketing multinível, quando remunera sobre o consumo e não
sobre o valor das adesões, não configura, obviamente, uma pirâmide
financeira", argumenta.
A empresa BBom, que em três meses já reuniu mais de 200 mil associados
e que também é alvo de investigação do MP,
nega a prática de pirâmide ou de qualquer ilegalidade. Segundo o
diretor de marketing da empresa, Ednaldo Bispo, é preciso "separar o
joio do trigo" e distinguir a pirâmide do marketing multinível.
"A gente entende a preocupação do MP, mas não queremos a nossa imagem
associada a modelos que estão sendo alvo de questioanemento. Pirâmide
vende dinheiro e não produto e serviço como é o nosso caso", diz o
diretor da empresa de rastreadores veiculares. "Também vendo rastreador
porta a porta. Nosso negócio não vem da entrada de pessoas, mas da
prestação de serviço", acrescenta.
Como a Telexfree, a empresa defende uma regulamentação do modelo de
negócio. "Faltam parâmetros sobre o que é de fato marketing multinível.
Por isso seria importante uma regulamentação", afirma o porta-voz da
BBom.
O MPCON não vê, entretanto, qualquer necessidade de regulamentação
complementar para o marketing multinível. "Quando é pirâmide e golpe dá
para perceber facilmente, pois não há objeto de venda, só aparência. O
que importa é a circulação de dinheiro", afirma Miranda.
Como identificar pirâmides
Para a Associação Brasileira de Vendas Diretas (ABEVD), as regras
atuais e o código de autoregulamentação do setor são suficientes para
diferenciar a pirâmide do modelo multinível, cuja atividade é e
praticada por diversas empresas no país como Amway e Herbalife.
"Reglamentação é o que não falta. O problema é que a grande maioria dos
esquemas de pirâmide transvestem de marketing multinível para iludir o
possível revendedor", afirma a diretora-executiva da associação, Roberta
Kuruzu.
As empresas Telexfree e BBom não estão entre as 32 associadas à ABEVD.
Roberta explica que a grande maioria das empresas de venda direta do
país se utiliza de algum mecanismo de marketing multinível, oferecendo
aos associados a possibilidade de ganhos complementares por meio da
captação de novos revendedores. Ela ressalta, porém, que os ganhos são
proporcionais ao esforço empreendido, com recolhimento de imposto e
garantia de devolução dos recursos financeiros.
As empresas associadas à ABEVD comprometem-se a cumprir e difundir os
códigos de ética e de conduta baseados no modelo mundial da World
Federation of Direct Selling Associations (WSDSA), que estabelece, por
exemplo, a oferta de modelos sustentáveis de negócio e que os ganhos
estejam atrelados a venda de produtos ou serviços cujos preços encontrem
correspondência aos similares do mercado.
A associação orienta, no entanto, que o mais importante é sempre
desconfiar de qualquer oferta de "dinheiro fácil" ou de "ganhos
astronômicos" em curto espaço de tempo.
"Quem que não quer ficar em casa sem fazer nada, só ligando para os
amigos e convidando para entrar?", diz Roberta, acrescentando que, em
muitos casos, entrar em um negócio deste tipo é "pedir para ser
enganado"
FONTE: G1 - O PORTAL DE NOTÍCIAS DA GLOBO