Dono da academia observa área atingida pelo Cessna; o local foi aterrado. (Foto: Orion Pires/G1)
Um mês depois do acidente aéreo que matou o candidato à Presidência da República, Eduardo Campos (PSB), e mais seis pessoas em Santos,
no litoral de São Paulo, comerciantes e moradores que trabalham e vivem
na área atingida ainda calculam os prejuízos. Eles aguardam uma posição
da Justiça sobre indenizações e a definição dos culpados pela tragédia
da manhã de 13 de agosto.
Um dos casos mais críticos é o do dono da Academia Mahatma, que fica na
Rua Alexandre Herculano, no bairro Boqueirão. O estabelecimento, que
funcionava há 40 anos e fica ao lado do terreno onde o avião Cessna
caiu, está fechado para o público. Embora a fachada esteja intacta, a
estrutura interna foi danificada e o prédio não possui seguro.
Juarez aguarda indenização dos responsáveis pelo acidente (Foto: Orion Pires/G1)
Os danos materiais vão desde rachaduras, aparelhos de musculação,
vidros e telhados quebrados até as três piscinas da academia, que
apresentam infiltrações e vazamentos. Benedito Juarez Câmara, de 69
anos, é dono do imóvel e afirma que ainda não é possível calcular os
prejuízos. "Olha, o que eu sei é que me cobraram R$ 180 mil só para
avaliar e identificar os problemas da piscina. É muita coisa para
arrumar e não tenho dinheiro. Para ser sincero, não sei por onde
começar. Se pudesse, sumia e só voltava daqui um ano", lamenta.
Até o dia do acidente, Câmara conta que tinha cerca de 800 alunos e 16
funcionários registrados na empresa. Trinta dias depois, o cenário mudou
bastante. Segundo ele, foi necessário demitir alguns prestadores de
serviço e remanejar 10% dos alunos para uma academia próxima. "Tive que
contar com a ajuda de amigos. Como a academia está fechada e o número de
alunos caiu bastante, tive que achar alguma solução imediata. Conversei
com um amigo e estou mandando alguns alunos para lá, mas tenho que
pagar por esse 'aluguel' também", conta.
Piscinas apresentam problemas de vazamento e a cerâmica está soltando (Foto: Orion Pires/G1)
O empresário reclama da falta de responsabilidade e da demora para a
identificação dos culpados.
"Enquanto ficam no jogo de empurra, ninguém
se responsabiliza. Ninguém dá uma satisfação. Cada um fala uma coisa. Já
apareceu um advogado dizendo que vai fazer isso e aquilo e sumiu. Claro
que fico triste pelo que aconteceu com as vítimas, mas preciso da
academia funcionando para sobreviver", relembra.
Até o momento, Câmara conseguiu apenas que a fabricante dos aparelhos
de musculação faça uma revisão de emergência. Alguns funcionários têm
tentado manter a limpeza do local, mas muita poeira e fuligem ainda
estão impregnados em boa parte dos equipamentos e piscinas.
Com muito otimismo, o espaço poderá ser reaberto em seis meses. Para
isso, será necessário contratar técnicos para fazerem um orçamento e um
laudo da reforma. O problema, segundo o empresário, é financeiro. "Se eu
tivesse dinheiro dava para fazer, mas não tenho. Tudo que construí ao
longo de 40 anos está aqui. Só consegui pagar os funcionários esse mês
porque eu recebo as mensalidades adiantadas. Mas tem aluno que pagou
pacote por semestre e estou tendo que devolver o dinheiro integral. É um
prejuízo incalculável ainda, porque fora os danos materiais, tem ainda o
tempo parado", relata.
Veterinária foi obrigada a suspender atendimentos por dez dias (Foto: Orion Pires/G1)
Rotina
A veterinária Priscila Dias Jens é proprietária de um pet shop, também
na Rua Alexandre Herculano. O estabelecimento fica na área atingida pela
queda do avião, teve vidros quebrados e o gesso do teto de duas salas
destruído. "Nem o seguro nós esperamos. Precisei fazer uma reforma
imediata e gastar do próprio bolso. Fiquei dez dias sem trabalhar e
tinha que ficar transferindo os animais para outra clínica. A reforma
básica ficou entre R$ 5 mil e R$ 6 mil, mas nessa conta não está
incluído o prejuízo de ficar parado. Como fica?", questiona.
Priscila conta ainda que, nos fins de semana, por exemplo, costumava
atender pelo menos 50 animais somente pela manhã. A rotina só está
voltando ao normal agora. "Ainda estou montando a planilha de gastos
para arrumar uma maneira de ser indenizada e também apresentar tudo à
seguradora. A rotina só começou a voltar ao normal esta semana",
explica.
Claudia e a filha Stephany receberam doações (Foto: Clô Macia/Arquivo Pessoal)
Recomeço
Claudia Quirino dos Santos morava com a filha, o irmão e a mãe no
apartamento onde a turbina do avião caiu. Tudo ficou queimado, não foi
possível salvar nenhum documento ou par de roupa. "Estamos tentando
recomeçar a vida. Tenho muito que agradecer à solidariedade de todos que
doaram roupas e acessórios para nós. Eu e minha família realmente
perdemos tudo", diz.
O apartamento em que Claudia vivia com a família era alugado, mas todos
os pertences eram deles. Ela estima que o prejuízo financeiro esteja em
torno de R$ 40 mil. São dois prejuízos, o emocional e o financeiro. Têm
dias em que eu paro para chorar, porque fico lembrando de tudo. No lado
financeiro, estamos pagando, por exemplo, coisas que eu nem tenho mais,
que ficaram queimadas depois do acidente. Infelizmente, nenhum
responsável nos procurou. Os donos do apartamento foram solidários, não
me pediram fiador, nem três meses adiantados de aluguel. Deus está
colocando pessoas boas no nosso caminho. A vida está començando de novo
para nós", agradece.
Remédio
A decoradora Zuleika Saibro mora em um sobrado na Rua Vahia do Abreu,
atrás do terreno onde a aeronave caiu. Ela estava em casa no momento do
acidente e acordou com o barulho da queda. Por conta do susto daquele
dia, ela explica que ainda é difícil ter uma noite tranquila de sono.
"Qualquer barulhinho eu acordo assustada. Preciso tomar remédio tarja
preta para dormir, porque toda aquela cena da minha casa com vidros
quebrados, a gritaria na rua e a fumaça ainda estão muito vivas na minha
mente", relata.
Zuleika diz que ela e o marido ainda não fizeram nenhuma estimativa do
quanto vão gastar, mas afirma que o trauma psicológico é maior do que o
financeiro. "Em todo canto da casa têm sinais de vidro quebrado e outras
coisas que fazem lembrar da tragédia. Temos que esperar a perícia para
poder entrar com pedido de notificação aos responsáveis pelo avião",
diz.
Dos fundos da casa da decoradora é possível observar toda a área que
foi destruída. Nas últimas semanas, a Prefeitura de Santos fez uma
divisão com tapumes no terreno, como se fossem muros, delimitando os
espaços que pertencem a cada residência. O local foi aterrado e quem
olha de cima só percebe que houve uma explosão na região por conta das
manchas de queimado nas paredes dos prédios vizinhos, janelas quebradas e
telhados cobertos com lonas.
Decoradora Zuleika ainda toma remédios para se recuperar do trauma (Foto: Orion Pires/G1)
FONTE: G1 - O PORTAL DE NOTÍCIAS DA GLOBO