terça-feira, 17 de junho de 2014

Conheça a história por trás dos bordões criados por Mussum



As piadas curtas e os maneirismos da fala se multiplicam pela internet. E frases que ele nunca disse viram piada quando associadas a ele.

Há 20 anos, em julho de 94, o Brasil perdia um dos grandes nomes do humor brasileiro: Mussum. Mas suas frases engraçadíssimas continuam vivas na memória de todos os seus admiradores. E agora, o Mussum ganhou uma biografia, para a alegria das novas gerações que vão poder se divertir com os bordões desse nobre trapalhão.

A cachaça engarrafada com mel era tudo que um tal Antônio Carlos tomava. E todo mundo chamava de mel. Até a hora que esse tal Antônio Carlos resolveu abreviar a coisa. E o mel virou mé.

Mussum: Nós vai tomar tudo de mé.

Toda sexta-feira, no começo da noite, ele chegava no buraco quente pro começo de um plantão que, às vezes, durava o final de semana inteiro. E assim, de bar em bar, de copo em copo que ele construiu o personagem de si mesmo. No bar, ele aprendeu a ser Mussum. Só que naquela época, ele era o Carlinhos do reco-reco.

Isso é: Carlinhos do reco-reco à noite. Porque de dia era um homem sério. Estudava o dia inteiro.

Alfabetizou a mãe e ralou muito para chegar a cabo da Aeronáutica. E foi nessa vida dupla ele formou o grupo "Os Originais do Samba".

“A diferença nossa é que nós tínhamos muita coreografia, muito passo, samba no pé”, conta Bigode, integrante do ‘Os Originais do Samba’.

Viajaram pelo mundo.

“Ficamos seis meses no México. Eu comecei a fazer Carmen Miranda ali, em 64. E o Mussum, os Originais do Samba, estavam ali me escorando, me ajudando”, lembra a atriz Marília Pêra.

Antônio Carlos era boa praça estava sempre rodeado de amigos. E foi nos palcos conheceu Elza Soares. E com ela, Mané Garrincha.

Elza Soares, cantora: Eu tinha um medo quando eles se juntavam que você nem acredita.

Fantástico: Por quê?

Elza Soares: Porque os dois gostavam de copo, né?

‘Os Originais do Samba’ ficaram famosos. E um dia foram convidados para uma participação em um programa de TV com Grande Otelo. Mas o Antônio Carlos estava com medo de aparecer.

“Ele ficava escondido ali, entre os cinco, ele deixava sempre pra que não descobrissem que ele tinha virado sambista”, relembra Maurício Sherman, diretor de tv.

Foi tentando se esconder, que ele ganhou o apelido que o tornou famoso.

“O Otelo tinha um diálogo com ele. De repente, ele improvisou, olhou pra ele e falou: ‘ô Mussum’. Aí o auditório caiu abaixo”, conta Maurício Sherman.

Mussum é um peixe preto e escorregadio. E foi assim que Antônio Carlos virou Mussum pra sempre.

A primeira aparição de Mussum, sem os Originais, em um programa de humor, foi nos primórdios da Escolinha do Professor Raimundo, de Chico Anysio. Que ele visitou anos depois.

Mussum: Eu brincava de falar assim enrolado. O Chico que falou pra mim não Mussum, você deve usar mais ‘tranquilis’, o ‘como de fatis’ e ‘não tem problemis’.

Foi aí que ele ganhou o linguajar que o deixou famoso.

Mussum: Cacildis.

Mesmo com um padrinho desses, ele não queria saber de ser comediante na tv. O negócio dele era o samba.

“O Mussum era o nosso humorista”, comenta Bigode.

Título que ele sempre recusou.

Mussum: Eu não me acho humorista. Humorista é o Jô Soares, Dedé Santana, Zacarias. O cara se transforma, tem vários tipos. Eu sou cômico, sou um caricato.

Até que uma dupla de comediantes percebeu isso. Eles eram ambiciosos, queriam aumentar sua trupe.

“Eu falei, ‘Renato, por que a gente não põe um afrodescendente?’, hoje é afrodescendente, né? No meu tempo eu falei: ‘por que a gente não bota um negão com a gente?”, diz Dedé Santana, humorista.

“Mas ele é músico, é sambista’, ele disse: ‘não importa, eu escrevo só as partes que ele vai entrar, só aquelas piadinhas, ele entra, dá a piadinha dele, sai, volta’”, conta Renato Aragão.

Demorou para que Dedé conseguisse convencer Mussum. Mas conseguiu. E o trio trapalhão depois virou um quarteto, com a entrada de Zacarias. E o domingo ganhou uma trilha sonora.

“Os trapalhões eram a cara do Brasil: tinha o nordestino, que era o Didi, tinha o Dedé, que era o galã da periferia, tinha aquele menininho que não cresceu, que era o Zacarias, e tinha o Mussum, que era o malandro do morro. Aquele cara que bebia e não dava mau exemplo”, explica Renato Aragão.

“Nos anos 70, 80 ou 90, eles faziam as mesmas piadas. A gente vê agora, 20 anos depois e continua engraçado”, afirma Juliano Barreto, biógrafo do Mussum.

Ele era caras e bocas e alvo de piadas por causa da sua cor.

Fantástico: Eram racistas as piadas que vocês faziam com o Mussum?

Renato Aragão: Ninguém entendia isso como racismo. Ninguém. Era uma brincadeira, era uma caricatura.

Fantástico: O personagem que ele fazia na TV era parecido com quem ele era?

Sandro Bernardes Gomes, filho do Mussum: Na verdade, ele fazia com bastante simplicidade. O Mussum era o cachaceiro. O Antônio Carlos, ele bebia normalmente.

“Pratico o halterocopismo socialmentis”, disse Mussum em entrevista.

“Ele era caseiro. Ele só era assim meio preocupado com as crianças em sentido de estudo, que ele era meio rígido”, conta Neila Bernardes Gomes, viúva do Mussum.

Ficou difícil para conciliar televisão, filmes e a música. Ele acabou expulso do ‘Os originais do Samba’.

Anos depois, o sucesso dos Trapalhões acabou levando o grupo a separação.

Renato Aragão: Eu não gosto de falar nesse assunto porque foi um ano muito difícil para nós quatro.

Dedé: Não foi entre nós a confusão foi de empresa para empresa, daí resolvemos fazer um filme, ele outro e tal.

Eles voltaram nove meses depois. Mas nunca mais foram os mesmos. E Antônio Carlos era um homem diferente daquele do começo dessa história. Ele ouvia jazz, fumava charutos importados e bebia whisky. Em 94 vieram os problemas de saúde. Ele chegou a passar por um transplante de coração, mas não resistiu.

Mas esse não foi o fim de Mussum. As piadas curtas e os maneirismos da fala se multiplicam pela internet. 

Vinte anos depois da morte, o trapalhão biografado segue presente. Mussum ainda está entre nós.






FONTE: G1 – O PORTAL DE NOTÍCIAS DA GLOBO

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